O máximo que puder fazer é miséria
não há como trazer o lazer
somente poder deixar morrer
não tem como ajudar algo como levar ao lar
deixar ter o banho, comida e água
A cama não é nem para olhar
a sala não é para você estar
sem o mínimo sentido sentimento
será pisado e ultrapassado
não há como lhe acudir
A construção inteira é um fim
Saia daqui
volte com dinheiro
não ligo para o seu desespero
Pague o aluguel
o cálice de fel
Pague a água parada
que a vida lhe cobra
sua estadia te pica e estraga
A possibilidade de trabalho é fome e sede
para seu nome e sobrenome
nobre miserável réles homem
Pague a luz
seu brilho dos olhos
a conta não reduz
Não há nada pra ti
só a união dos vazioso canto das ruas
a desunião e solidão o fato do desprazer
e o ato de sofrer
MonoTeLha
O coração não bate maisum minuto atrás morreuuma parada numa estação erradaum ataque súbitoseu amor faleceuO coração ria mas choroude uma dor num fogo loucofoi assado em torturadesamparado e solitárioO coração não aguentouele parou num sinalbem vermelho e numa ruatriste como a minha e a sua Ele tentou ser reanimadomas já estava cansadoa miséria havia lhe matadoe a sociedade lhe enterradoMonoTeLha
Vende-se o mundo Não é baratomas é liquidaçãopobres não comprammas ricos obtémtudo podem tere pagam pra verVende-se o mundoCom tudo dentroincluido seres vivospacote completoVende-se o mundo ricos vendemricos compramMonoTeLha
Andando de barco no esgoto
não me deixa parar de ver
sujeira e tristeza
Meus olhos com lágrimas
contém da poluição
boa parte que me arde
me separa ao meio
É sempre tão fria a lâmina da realidade
que nôs corta e entorta a vista
Está tudo sem cabeça
e para baixo
caído e indiferente
aos montes de vazios
Andar de avião no ar sujo
me faz ver tudo morto
só barbárie em toda parte
Me desculpe não poder atender
a telefonia do cãncer celular
a chamada de espera SOS
foi desligada
A natureza morrendo num mundo sendo vendido
os preconceitos evoluindo virando bombas
no meu avião
no barco
e tanque de guerra individual
solidão total
Num coletivo sem sentido
a vida beirando o lixo
o indivíduo pede ajuda e agoniza
sem que ninguém lhe acuda
Trem fora dos trilhos
meninos indo ao genocídio
a guerra que enterra
no deserto das possibilidades
Os vermes numa alucinação real
comendo sonhos
devorando as esperanças
A clínica de desentoxicação mundial
está fechada para os viciados
Drogas Estatais, mundiais e boçais
O hospital sem médicos e com aval
para receber as vítimas sozinhas
nas ilhas desertas do sentir
O shopping do desespero
vende pânico mais barato
pra comercializar a sede animal
destrutiva e indiferente
com força total
A loja de bichos vende crianças escravas
e seres sem vozes humanas
mas as bandas tocam
imploram seus ódios sem amores
sons de dor e muito terror
Gritar virou besteira
igual ao choro
ao mundo todo
ao socorro que não chega
nem lá nem cá
Fomos andar a pé
entrarmos numa caverna qualquer
prédios de risadas televisionadas
Esperando tudo se aniquilar
pra depois tentar passear
num mundo com umas sobras
restos de obras desumanas
MonoTeLha
O resultado chega
dizendo que a proteção
acabou
meu corpo frágil
se tornou
HIV positivo
tira a calma dos trilhos
descarrila o viver
Apoiado agora em remédios
e cuidados sérios
O que fazer
juntar os caquinhos nessa ida
maldita desprotegida vida
HIV positivo
fato negativo
a ser vivido
por não se proteger
agora é mais fácil
adoecer
Tentar se cuidar
e para os outros
o vírus não passar
Tudo protegido
ou correr perigo
no caminho mais rápido
para o cemitério eu sigo
se eu não me cuidar
caso eu não venha a me tratar
HIV positivo
corpo desprotegido
Sigo
vou indo
frágil
correndo perigo
MonoTeLha
Declaro minha miséria
meus trapos os meus farrapos
Fotografias de jornais
de onde fico largado
Descrevo a fome
que sinto
estou subnutrido
Minha sede
sem água potável
mas cheio de alcoolismo regado
Enumero pertences
restos de nada
perdas de dentes
Meu analfabetismo
Não sei escrever nem ler
anota ai
senhor doutor
Minha enorme miséria
as feridas abertas
meus sacos plásticos
e filhos pivetes
vendendo chicletes
Declaro minha renda
o vazio nos bolsos
a pobreza acorrentada
nos pés e pescoço
Todos os ossos do ofício criados
para manter a estrutura de pé
e as vítimas da fome caídas
Possuo a vista dos ricos me pisando
cartão postal da injustiça
Governo manipulador
carência planejada
miséria alastrada
garante minha propriedade
o oco em toda minha idade
Salário mínimo
garantido em minha vida
triste sina
Tenho altos ganhosChoque elétrico tétrico escrito ordem nas armasDireitos humanos no casseteteGuardo no corpo as porradas da políciaas proibições de trabalharo imposto que não posso pagar
Possuo educação e saúde
esculachada geral
desemprego brutal
Estado funcionando
garantindo a queda do abismo
é o que tenho em direito
Ricos lucrando e eu pobre
apodrecendo em relento
A vida escravizada dos pobres
está agora declarada no imposto de renda
entre escombros e destroços
Nada a declarar
então declaro minha miséria
toda a pobreza
o vazio citado
o corpo devastado
MonoTeLha
A boca do lixoque come genteolha o meninoSeus dentes contentese língua saltitanteolham a meninaQuer sempre mais um pra mastigarpara triturarA boca do lixonão defeca eis queela é a própria merdaSeu estômago de pestereflete a sociedadeSua doença não é um testeA sua existência permaneceao norte sul leste e oesteA boca do lixoquer engolirqualquer umque passar por aliA boca do lixoestá esfomeada como semprenum ronco de mil mendigosem cada gota de salivaEla quer comertanto faz eu ou vocêMonoTeLha
Pode - se comer agora o lixo
não falta mais a contaminação total
Vai menino come
não fique com fome
Os coliformes fecais vão ser temperados
em cada prato no ato
Os metais pesados estão preparados
para serem servidos no caldo
Exageiro de sal e açúcar concentrado
no preparo de cada receita na mesa
Tortura animal
soja desvastação florestal
para todos os desgostos
Conservantes e químicos
no cardápio em preparo rápido
Pode escolher o que comer
e na digestão apodrecer
MonoTeLha
O menino brincava com a arma
em coma o menino não brinca mais
Morto ele não corre alías
não vai atrás dos colegas não brinca de pique e pega
Ele comia balas doces
a munição comeu a cabeça dele
A brincadeira de polícia e ladrão
virou realidade sangue no chão
Mamãe e papai
cada um chorou
a indústria sorriu
senhor das armas lucrou
O menino caiu
a bala furou
e mais uma vida
acabou
MonoTeLha
O frio gela lá fora
esse cobertor é o que salva
ele cobre a pele que sofrepobre de vida torpeHá a febre no casulo
o corpo moribundo
numa dor de um urso
que não hiberna
nem vai virar borboleta
Não tem terra para se plantar flores
só o habitat inóspito
depósito de carcaçaspobres desamparadoslargados pelos cantosentre gemidosnas gélidas marquisesMaltratado na fome
é o nome próprio
um registro geral e nada mais
mas esse cobertor é o que resta
lá fora o vento nuclear
quer abraçar
A febre de dentro conversa
bêbada ela vai deixando tonto
a entrada de ar virou caverna
a puxadinha do tecido nos pés
virou trabalho de gente grande
nada das coisas de criançasque brincam e sonham
Lá fora é invernoe dentro há sonhos de inferno
a miséria é sempre fronteira
em cada beira
em cada teia
a aranha quer pegar
o guarda quer fuzilar
É o início da noite fria
há gritos dentro dessa maloca
e uma mente louca solitária
sem saber o que é o que é
A dor vêm já pesada
para dar suas cartas
da cara desse mundo
sem ferramentas para consertar
tem que deixar tudo quebrado
sempre só esquecer
lembrar de perder tudo
só saber estar na rua
sem família
sem amor
sem amigos
O cobertor é o que salva
venha cá saco de lixo
vou lhe dar carinho
por favor
me beije a boca
MonoTeLha
O boneco vai sendo feito
Cordas nos braços e pernas
Roupa colocada em série
traços e gestos
certos manipulados
O boneco se mexe
para lá
O boneco é jogado
para cá
A marionete começa
o trabalho
sempre controlada
Se ele quebra
não se conserta
Joga o boneco
inteiro fora
Se a corda do controle arrebenta
coloca-se outra mais forte ainda
O boneco nada ganha nada possui
só trabalha para um robô engravatado
que o comando os seus passos
Mexe - se aqui ele come ali
mexe lá e vai pra caixa suja
O boneco é morto
só fica vivo
se ficar livre
virando pássaro solto
pelo mundo todo
MonoTeLha
Os vândalos neurônios
jogam baldes de pensamento
líquido e quente
nas engrenagens elétricas
da subserviência mesquinha
Vomitando agora
o artificial
Células se alimentam
com o natural
A revolução desce e espinha
faz o pulmão enfim respirar
agora luta para engolir o ar
O corpo é tomado pela anarquia
fica organizado em pernas e braços
num tesão a flor da pele
lutando contra a autoridade
Ser desuniformizando
ao lado de bichos soltos
para lá e para cá
A dança se espalha
pedaço por pedaço
do ser libertado
MonoTeLha